sábado, 8 de maio de 2010

KARIMAN. O REENCONTRO

Recorte do jornal Zero Hora de 1975.


PELAS BANDAS DO ROCK

Tudo começou naquela tarde de sábado, quando recebi um telefonema do baterista Tonho, antigo companheiro de música do Kariman, banda de rock dos agitados e confusos anos 70. Ele me passou um endereço, dizendo que eu fosse até lá que eu teria uma boa surpresa. Curioso, no horário determinado fui até o local e qual não foi minha surpresa quando dei de frente com meus outros antigos parceiros. Lá estavam o Edu (Eduardo Ribeiro Camello), o Taby (Altamir Floriano Pedroso) e naturalmente, o Tonho (Luiz Antonio Martins da Silva).

Foi uma grande alegria. Aqueles quatro amigos beirando os sessenta anos não se continham de tanta emoção diante daquele inesperado reencontro. Passamos horas relembrando antigas histórias vividas nos espinhosos caminhos do rock dos anos sessenta e setenta, época em que existiu o grupo Kariman, aliás, a primeira banda de rock de Santa Maria a ir se fixar em Porto Alegre. Era uma fase em que ainda se fazia um rock praticamente de forma artesanal, e esta é razão de tantas histórias que acabaram virando lenda.

Rememoramos diversos grupos com os quais convivemos e fizemos shows juntos. Entre eles, o lendário Bixo da Seda (antigo Liverpool) do Fughet Luz, Mimi, Marcos Lessa, Edinho e Pecos (substituído depois por Cláudio Vera Cruz). Também havia o grupo Bobo da Corte do guitarrista Zé Vicente Brizola e da baterista Gata, o Utopia de Bebeto Alves, além do Bizarro com a qual fizemos shows inesquecíveis no Elizabeth Parque Clube.

Como se ainda fossemos jovens, saímos a caminhar à toa pela cidade em meio a tantas conversas e lembranças. Até que escutamos música vinda de dentro de uma dessas casas noturnas que apresentam música ao vivo. Entramos e ficamos escutando, quando um dos músicos que havia nos conhecido, pediu para que déssemos uma “canja”, como se diz na gíria musical.

Não pensamos duas vezes. Subimos no palco e, embora não tocássemos juntos há trinta anos, desfiamos músicas de nosso antigo repertório como Something, Anytime at all, Dont let me down (Beatles), I Started the Joke, First of May (Bee Gees) Angie, Lady Jane (Rolling Stones) e naturalmente, músicas de nossa autoria como Queria Ser, Preciso Urgentemente lhe Falar, O Escritório, Hoje eu vou Fugir de Casa, Companheiro e tantas outras. Foi uma emoção inesquecível. Parecíamos de novo aqueles jovens músicos que sonhavam em mudar o mundo com a força de canções com melodias simples e letras ingênuas falando de amor e de um mundo de paz.

Lá pelas tantas, chegaram os nossos velhos amigos, Paulo Rosa e Bidão (Alcebíades Fernandes de Melo) que chegaram a fazer parte de nosso grupo durante algum tempo. Juntamo-nos em uma espécie de “jam session” e a música continuou fluindo de forma improvisada. Quanto mais a platéia aplaudia, mais queríamos tocar.

De qualquer maneira, tudo o que é bom tem que acabar. Chegou a hora da casa fechar e tivemos que ir embora. Como nos velhos tempos, fomos para um desses bares que amanhecem abertos e recebem aqueles boêmios de fim de noite, entre eles, os músicos, garçons e damas da noite que saem de seus trabalhos. Ocupamos uma mesa e continuamos nossa sessão nostalgia. Para relembrar nossos finais de noite no Mercado Público na época em que tocávamos em Porto Alegre, pedimos batida de mamão acompanhada com cachorro-quente.

Muita conversa rolou, até que resolvemos ir embora, cansados, mas com a alma leve e renovada com tudo o que havia acontecido. Nos despedimos fazendo planos de nos encontrarmos novamente e saímos, cada qual para o seu lado.

Fui caminhando devagar ainda envolvido por aquela emoção maravilhosa quando, de repente, ao virar a esquina, tive a sensação de que eu estava me desvanecendo e desaparecendo no ar. Quando abri os olhos, me dei conta de que estava deitado em minha cama com o meu cão Floquinho encostado aos meus pés.

Aí é que eu fui perceber que, infelizmente, tudo não havia passado de um sonho. Eram cinco horas da manhã e não consegui mais pegar no sono. Fiquei deitado na cama rememorando aquele sonho e lamentando que o fato dele não ter sido realidade.

Lá pelas tantas, o dia raiou e iluminou o quarto. Levantei e voltei para a minha atual realidade. Fui para a minha sala e logo eu estava envolvido novamente com livros, doutrinas, jurisprudências, petições e pesquisas. Desta vez, tangido por aquela estranha sensação de um reencontro que não aconteceu e envolvido por aquela suave nostalgia relativa a um tempo em que os jovens ainda planejavam um mundo melhor, acreditavam em utopias e sonhavam sonhos que hoje, não mais arriscamos a sonhar.

Jorge André Irion Jobim

Música Companheiro que fazia parte do repertório da Banda Kariman. Aqui ela foi gravada apenas por mim em um programa caseiro e com um velho violão que eu ainda conservo pendurado na parede. Pela falta de uso, ele já está fora de escala. De qualquer maneira, dá uma ideia de como era a música.

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