segunda-feira, 1 de março de 2010

ABDUÇÃO DE FREGUÊS


Todo o pequeno estabelecimento comercial das periferias, entre eles os mercados, armazéns, botecos, vendas, biroscas e congêneres, vivem do comércio varejista de pequena monta, geralmente aqueles itens que as pessoas esqueceram de comprar nos grandes hiper e supermercados. Mas a melhor fonte de renda de tais negócios, é justamente a venda de bebida alcoólica, geralmente consumida em cadeiras colocadas do lado de fora de tais estabelecimentos.

Ao passarmos por alguns destes locais, sempre encontramos alguns fregueses que, em virtude da habitualidade com que os freqüentam, acabam se tornando umas espécies de móveis e utensílios dos ditos botecos. Alguns destes clientes são tão bons, que acabam tendo o privilégio de poderem abrir contas “no caderno” pagáveis sempre no fim do mês, época em que recebem seus salários ou suas aposentadorias.

Não é raro termos notícias de que alguns deles deixam na venda, quase 50% de seus ganhos. Como são bons pagadores, muitos deles são bastante disputados pelos donos das biroscas, claro que dentro de uma certa ética.
Será? Nem sempre. Às vezes isso acontece de maneira bastante inusitada. Por exemplo, alguém já ouviu falar em abdução? Para quem não sabe o que é, trata-se de uma figura vedada nas relações de direito internacional que se consubstancia em levar uma pessoa de um país para o outro através de fraude, violência ou sedução.

Pois outro dia, eu passando na frente de uma venda, vi um desses fregueses habituais bebendo sua famosa “cervejinha” na companhia do dono de outro estabelecimento bastante conhecido por ter também os seus fregueses “de fé”. Achei estranho aquele senhor sair do seu bar e ir beber em outro. De qualquer forma, achei que ele podia estar querendo “mudar de ares”.

Permaneceram ambos ali conversando durante certo tempo, até que, quando o “bebedor inveterado” estava já bastante “alegre”, o dono da outra venda se retirou, dando a entender que estava indo embora. Pois não é que dali uns dez minutos, ele retornou de carro e levou com ele o freguês “nota dez” daquele mercadinho?

Bem, até aí nada de mal, afinal, eles poderiam ter algum assunto pendente em comum e estarem saindo juntos para resolvê-lo. Acontece que mais tarde, quando fui fazer minha caminhada, ao passar pelo bar do segundo bodegueiro, quem estava lá? Pois é. Justamente aquele mesmo freguês preferencial da outra venda com o qual ele estava conversando anteriormente.

Foi então que percebi que se tratava de uma nova forma de ganhar na disputa de tais clientes bons pagadores. Vai-se até o lugar onde eles freqüentam, passa-se neles uma boa conversa, espera-se que os efeitos do ácido etílico os deixe mais vulneráveis e os convida a mudarem seus hábitos, aliciando-os a beberem em seus bares. É uma nova modalidade que, por analogia, podemos chamar de abdução de fregueses. É claro que no caso em que estou tratando, realizada através do poder de sedução do abdutor.



Jorge André Irion Jobim